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sábado, 6 de fevereiro de 2021

XVI. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme - A Quinta Geração

 
Hoje terminaria a resumida saga do desenvolvimento dos computadores. Byte e Bit tinham feito uma sombra com uma colcha e quatro canas espetadas, e gozavam o fresco à beira-mar, na parte sul da praia do Monte Clérigo, frente ao laredo baixo.

— Posso ir apanhar uns mexilhõezinhos, se o profe quiser. — Dispunha-se Bit.

— Não. Deixa a maré vazar mais um pouco. Vamos entrar na Quinta Geração.

— Então acabamos hoje? Não tinha dito que eram cinco, as gerações? — Inquiriu Bit, na esperança de algum alívio. — Depois são as férias!

— Mais ou menos, mais ou menos. A tua pressa prejudica a aquisição de conhecimentos. — Observou, com desagrado. — Nesta geração, registaram-se alterações significativas na construção dos computadores, nomeadamente no relógio, a emitir cada vez mais ciclos por segundo, e ainda o desenvolvimento da capacidade de executar várias instruções por cada ciclo.

— Ainda as ondas! Então e os transístores?

— Só para fazeres uma ideia, enquanto em 1975 o processador tinha uns 65.000, um Intel 486, em 1989, já usava 1.400.000 e, por 2011, o i5 integrava 1.160 milhões.

— Dá para perceber que cada vez mais integração e, é claro, maior rapidez de processamento. — Era o Bit a querer surpreender Byte.

— Hum! Estudaste alguma coisa? — Byte mostrava a sua satisfação. — Mas um grande passo foi dado também ao nível do software, extraordinária evolução nos sistemas operativos e nas linguagens de programação.

— E a Internet?

— Claro, a Internet. O seu embrião aparece em 1974 a partir da ARPANET.

— Mas um dos passos mais importantes advém do desenvolvimento das pequenas soluções, portáteis, e da desmitificação da informática. A informática vai ao encontro do utilizador, dispensando-o de um grande número de conhecimentos especializados para poder usar a sua plataforma. São as plataformas amigas-do-utilizador (user friendly).

— Mas continua a haver investigação e desenvolvimento, não é? — Bit, interessado. — Cada vez aparecem soluções tecnológicas mais complicadas e… parecem tão simples!

— Claro que o trabalho dos cientistas não pára. Os processadores são cada vez mais rápidos, e os sistemas de armazenamento com cada vez mais capacidade e maior velocidade de acesso aos dados.

— É isso sim, com o meu telemóvel tenho tirado milhares de fotografias que guardo numa nuvem! E vou vê-las quando quiser.

— Sim, até parece que estão mesmo no teu telemóvel! E as conversações com imagem, que vieram a permitir as videoconferências?! E o envio e recepção de objectos multimédia a distância?! Altas tecnologias… no teu bolso.

— Mas dizem que alguns ácaros podem estar sempre à coca das nossas comunicações e intrometerem-se. — Bit expunha a sua falta de confiança na tecnologia.

— Ah! Ah! Ah! Ácaros! — Byte não conseguiu reter uma gargalhada. — Hacker. Diz-se hacker e não é ácaro coisa nenhuma. Já me fazes lembrar o programa radiofónico Portugalex! Não existe uma palavra em português. São técnicos altamente competentes que se introduzem nos sistemas alheios, de forma ilegal, para causar danos ou roubar informação.

— E a robô Sofia? Ela pertence a que geração? — Bit não se deixou abater com o disparate.

— Muito bem, ainda te lembras dela, da Sophie. Pois esta geração, a quinta, é uma das que tem durado mais anos. Há mais de vinte anos que se fala que ela cobrirá a Inteligência Artificial. Da qual a Sophie é um dos mais recentes prodígios.

— Dizem que os robôs vão dominar o mundo…

— A Robótica tem tido grandes desenvolvimentos. Há já robôs que desempenham importantes funções de ajuda a muitos níveis, desde as linhas de montagem, a funções domésticas, gestão de tráfego, enfim inúmeras. Mas ainda falta algum tempo para que eles pensem e tenham emoções.

— Mas essa Sofia, um dia destes vi-a na TV a dar uma entrevista. Hi! Hi! — Bit ironizando. — E agora, já posso ir aos mexilhões?

XV. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme - A Quarta Geração

 


Byte e Bit caminhavam lentamente e em silêncio desde a curva da estrada do Monte Clérigo. Pararam por alturas do Rasto-Judeus admirando o areal e a fraca rebentação da preia-mar. O mar parecia um lago, quase sem surfistas. Era a praia de novo para os banhistas, sem perturbações.

— Hoje o mar não está para os surfistas. Nunca te sentiste atraído pelo surf? Isso ajudava-te a ter uma melhor percepção dos ciclos, ciclos temporais.

— Eu não, professor? Para a motoreta ainda tenho equilíbrio, agora para a prancha… Mas o que é que isso tem que ver com os temporais? — Bit não percebera o contexto.

— Quais temporais?! São ciclos que demoram um certo tempo. — Byte mostrou-se um pouco impaciente. — Nas ondas, mesmo nas pequenas, há um momento em que a onda se começa a formar e a água sobe, até um ponto mais alto, a crista, e depois desce até um ponto mais baixo, o vale, e depois retoma a mesma altura da partida. Esse movimento, completo, chama-se um ciclo e, consoante o tamanho da onda, assim é mais extenso, ou seja, demorado, ou mais curto, é o comprimento da onda.


O professor Byte acompanhava a explicação descrevendo movimentos ondulatórios com as mãos em curva, captando a atenção de Bit que as seguia com o olhar, não se poupando a algumas caretas.

— Já percebi! — Exclamou Bit, — aí estão os ciclos! Quando há temporal as ondas são maiores e os ciclos também são maiores, são estes os ciclos temporais.

— Não exageres. Os ciclos duram um tempo e é esse o tempo de que vamos falar, hoje, como nas outras vezes: tempo… até onde o consigamos entender. Lembras-te do tal milhão de operações por segundo?

— Sim, claro. A tal adição com um milhão de parcelas! — Bit ainda atalhou. — Mas isso é muita areia para a minha camineta.

— Claro que é! Conheces a cantiga que diz que “há ondas sem ser no mar”? Pois há ondas no ar, que não se vêm. São impulsos energéticos que transportam energia. Podem ser mecânicas ou electromagnéticas. Por exemplo, a luz propaga-se no vácuo, assim como as ondas de rádio, de TV, microondas, etc.

— Profe, vá um bocadinho mais devagar que já estou almareado com tanta onda!

— Percebo. — Byte, contemporizando. — Precisas apenas de pensar em termos de quantos ciclos terá uma onda em cada unidade de tempo. É a frequência. Mede-se em ciclos por segundo, ou Hertz.

— Isso é mais ou menos quantas ondas por segundo? — Concluía Bit.

— Então, voltando ao milhão de operações por segundo, diz-me lá, quanto tempo é que achas que esse computador levaria para efectuar apenas uma operação, por exemplo adicionar dois números? — Byte fixou Bit, expectante.

— Sei calcular, eu era bom nas aritméticas. Basta dividir 1 segundo por um milhão.

— E o resultado é?… — Byte continuou o desafio.

— Então dá um mil… um milésimo… não, um… coiso. Olhe professor, não sei dizer.

— Pois fica sabendo que se diz um milionésimo de segundo. — Ajudou Byte, e continuou, — Pois hoje vamos entrar na Quarta Geração, e nela, o tempo conta-se em fracções muito inferiores a esse tal milionésimo. E para te confundir mais um pouco, o computador trabalha como as ondas e, em cada ciclo, pode executar uma operação.

Estava-se bem ali, a suave brisa massajava o rosto e refrescava a cabeleira. Dois montinhos de pedras convidavam a sentar.

— Ficamos aqui, até ver. — Byte sacou do caderno. — Este período vai desde 1977 até aos anos 1985 ou 1991, não é uma marca muito exacta.

— Nesta geração os chips, segundo a Tecnologia de Integração em Muito Larga Escala (VLSI) puderam integrar cerca de cem mil transístores. Trouxeram uma substancial redução de tamanho pelo que começaram a ser chamados de microprocessadores.

— Foi então que apareceram os microcomputadores, não foi? — Aventurou-se Bit.

— Na verdade esses já apareceram na geração anterior. Mas é nesta que se dá o grande desenvolvimento do Computador Pessoal, o PC, equipado com os microprocessadores da Intel, como o i286, i386, etc.

— E o Windows vem desse tempo? — Perguntou Bit.

— Sim. Nos anos 70 foram fundadas duas importantes empresas para o desenvolvimento de Sistemas Operativos e pequenos computadores:



A Microsoft, por Bill Gates e Paul Allen,

 





e a Apple, por Steve Wozniak, Steve Jobs e Ronald Wayne.

 

 


— Então estes é que foram os tais cientistas de garagem! — Exclamou Bit, que já tinha ouvido qualquer coisa sobre aqueles dois.

— Sim, é verdade. E das suas garagens saltaram para o mundo do sucesso. Bill Gates, por exemplo, é um dos mais ricos homens do mundo. Foram autênticos pioneiros no desenvolvimento dos computadores de pequeno formato.

— Tão rico assim e temos de pagar tanto por um PC! — Suspirou Bit. — Ficamos aqui, até ver…

XIV. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme - A Terceira Geração

 
— Então estás hoje com melhor disposição para a nossa conversa? Sei que o Aljezurense ganhou e que o teu sobrinho marcou o golo da vitória.

— Se o professor tivesse visto! — Atalhou Bit, com satisfação. — Foi um golaço, e no último minuto!

— O teu sobrinho e o resto da equipa constituíam um grupo integrado. — O professor introduzia assim a ideia do Circuito Integrado. — Todos ligados entre si, pelo menos ideologicamente, todos contribuindo para um objectivo comum: marcar.

— É o que lhe dizia, — acrescentou Bit —, até o guarda-redes joga e pode marcar.

— Pois é a principal característica desta Terceira Geração de computadores: a integração, ou melhor, o uso do Circuito Integrado. O CHIP.

Bit fez aquela cara de quem não percebeu bem, esperando explicações adicionais.



— É um dispositivo parecido com uma pastilha, (também há quem o ache parecido com uma barata), que concentra um certo número de transístores interligados com silício ou germânio. Receberam a designação de CHIP. São preparados para trabalharem em conjunto. Em 1965 reunia cerca de 30. Era a tecnologia da Integração em Pequena Escala (SSI), evoluindo para cerca de 1.000, na tecnologia de Média Escala.

— E assim, rapidamente se passou da válvula para o transístor, — Concluiu Bit. — Mais uma geração! Mais dez ou onze anos? Até 1974, não é?

— Sim, a integração continuou a evoluir. Além de permitir uma significativa redução de tamanho e do consumo, possibilitava um significativo aumento de velocidade de processamento. Já se registavam mais de um milhão de operações por segundo.

— Mais de um milhão? Por exemplo, uma conta de somar com um milhão de parcelas?!

Bit ficou estarrecido. Ele que se ia perdendo no concurso de somar 20 parcelas, que tempo precisaria para uma adição de 100 parcelas? E mesmo que fosse com máquina… não conseguia imaginar. Exclamou: “Um segundo? É tão pouco tempo!”

— Já aqui te falei do IMB 360. Pois este também foi evoluindo e foi um dos primeiros computadores a usar os chips. Esse e outros duma marca de que hoje quase nem se fala: a Burroughs Corporation com os seus modelos B3500 e B3600. 

Sistema IBM/360

— ‘Tou a ver que a IBM continuou a marcar uma posição importante também nesta geração. — Comentou Bit.

— Sim. Com hegemonia. É nesta geração que se desenvolve a conquista do espaço. Em 1969 o Homem chega à Lua. O Projecto Apollo usava um computador AGC (Apollo Guidance Computer) para controlo de todos os sistemas da nave, com mais de 4.100 circuitos integrados.

— Ouvi falar nessa viagem. Mas o Homem foi mesmo à Lua? — Bit, sempre com dúvidas.

— O quê? Mas tens dúvida? É claro que foi. E qualquer dia há-de chegar a Marte. Pois os computadores não param de evoluir. Já em 1965 Gordon Moore (que veio a fundar a INTEL) previa que o número de transístores em cada chip duplicaria cada 18 meses.

— Ups! Bem professor, hoje pago eu uma imperial para celebrar a vitória do meu sobrinho.

— Então está bem. Vamos lá que a maré vai subir não tarda e eu tenho de passar o rio para a Amoreira.

XIII. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme - A Segunda Geração

O professor Byte tinha prometido surpreender Bit ainda mais. Preparara uma pequena tabela onde relacionava as novas gerações com as respectivas tecnologias. Sacou-a do seu bornal e pigarreou para chamar a atenção de Bit, como se lhe dissesse “vamos lá a começar”, e por aí foi:

— Designa-se por Segunda




Geração a que se estendeu pêlos anos de 1955 a 1965, recorrendo à intensificação do uso dos transístores e desenvolvimento das chamadas Linguagens de Programação de Alto Nível.

— Lá se vão as válvulas! — Proferiu Bit. — Os transístores permitiam maior velocidade de processamento, não? Estou a perceber que cada passo é sempre no sentido do melhor desempenho.

— Estou também surpreendido contigo! — O professor Byte continuou a sua lição. — Começaram por ser cerca de cem vezes mais rápidos que as válvulas.

— E repara nesta imagem. — Byte puxou de mais um papel do seu bornal. — É o símbolo do transístor desenhado numa das calçadas da Universidade de Aveiro.

— As máquinas mais relevantes nesta segunda geração foram a IBM 1401 e, numa fase de transição para a terceira geração, o muito conhecido Sistema IBM 360.

— Estes computadores, — continuou Byte, com entusiasmo, — beneficiaram da nova tecnologia que lhes trouxe uma redução de tamanho e melhorou os consumos.

Bit distraiu-se um pouco, olhando o mar, como gostava de fazer sempre que se sentava naquele espaço de leccionação ao ar livre, e logo Byte lhe remocou, “Se hoje não te apetece aprender, fazemos uma pausa e continuamos amanhã. Deves estar a pensar no jogo de logo à noite. Pensa no Vídeo Árbitro e repara como a tecnologia evoluiu até ele”.

— Desculpe. — Bit com humildade. — Não é desses, é o jogo de futsal entre os cinco do Aljezurense e os cinco do Rogilense, um autêntico derby. Está lá o meu sobrinho e vai começar daqui a meia hora.

— ‘Tá bem. Vamos acabar. Presta só atenção aos novos periféricos que estas máquinas usavam.

— Periféricos?! — Bit surpreendido. — O que são esses?


— São outras máquinas que estão na periferia, quer dizer, à roda do computador e que servem para entrada e saída de dados e informação. — Mostrou novo papel. — Leitores de fita perfurada, de banda magnética e discos rígidos. Olha para eles e… pronto, terminamos.

 

 

XII. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme - Mais de 5.000 Adições por segundo

 O professor Byte já estava na Ponta da Rocha quando Bit chegou com a sua ruidosa motorizada. Byte deitou-lhe um daqueles olhares e consultou o relógio.

— Então? Só agora?

— Olhe, foi por sua causa, — avançou Bit, — o carteiro queria que eu lhe trouxesse uma carta e tive de esperar. — E estendeu-lhe a carta.

Enquanto Byte fazia uma leitura rápida da mensagem, Bit preparou a sua sebenta. Já sabia que hoje a aula seria das mais importantes.

— Uma aula muito importante! — Byte parecia ter-lhe lido os pensamentos. — Podes começar a tomar notas. Ficámos em meados do Séc. XX, num tempo em tudo evolui a uma velocidade estrondosa. Já te falei de várias máquinas que surpreenderam o mundo com a sua velocidade de cálculo, mas que todavia evidenciavam vários senãos, quase sempre associados aos elevados custos da sua construção e da energia para o seu funcionamento, assim como ao espaço necessário para a sua instalação.

— Sim, lembro-me. Foi o tempo dos relés.

— Pois foi. — Byte pigarreou. — Mas eis que surgem novas opções. A tal válvula, que dizias que era coisa para os carros.

— Sim, essa. Mas disse-me que os grandes utilizadores eram as telefonias, os aparelhos de rádio daquele tempo. — Pelo ar que Byte fez, Bit percebeu logo que tinha ido além do que devia.

— Atento! — Byte exibiu o seu ar de reprovação. — Esta válvula, que já se conhecia desde há muitos anos, conseguia a impressionante proeza de ser um milhão de vezes mais rápida que os relés. Com a sua utilização dá-se um grande salto na evolução destas máquinas, marcando assim o início da “Primeira Geração de Computadores”.

— A primeira Geração? — Bit estava a ficar mais confuso. — Então e o que está para trás? Aquelas máquinas afinal não eram computadores?

— Ó Bit, expliquei-te nessa altura que iríamos estudar os precursores. Sabes o que são? São aqueles que aparecem antes… Que coisa! Não levas isto a sério?

Byte passou a explicar que as válvulas permitiram avançar para a construção dos primeiros grandes computadores (mainframes) usados naturalmente para fins militares, sobretudo para o cálculo das tabelas de tiro e para a codificação e descodificação de mensagens.

— Olha para esta imagem. — Byte abriu o seu bornal e de lá retirou uma fotografia com o que parecia uma gigantesca central telefónica (PBX). — É o computador mais famoso daquela época, o ENIAC - Electronic Numerical Integrator Analyzer and Computer, construído em 1945.



— Chi! É mesmo tipo… uma central telefónica, tipo… antigo! — Bit não resistiu a este jocoso comentário.

— Sim, até parece, mas repara no tamanho. — Byte preferiu aproveitar o momento de atenção de Bit. — Pois olha, o ENIAC era composto por nada menos do que 17.468 das tais válvulas.

— Ena! — Bit evidenciava o seu espanto.

— Então repara: tinha uma velocidade de cálculo surpreendente, para a altura. Efectuava apenas 5.000 adições, 357 multiplicações e 38 divisões por segundo! O que te parece?

— Acho bué, bué, bué! — Bit nem encontrou palavras para exprimir o seu espanto.

— No próximo dia ainda vais ficar mais admirado. Mais do que três bués! — Byte convidou o discípulo para um refresco. — Levas-me na tua motora até ao Sargo e vamos tomar qualquer coisa?

XI. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme - ZUSE e AIKEN

 Como não estava ninguém na ponta rocha, ocuparam os lugares habituais. A maré estava cheia e as ondas batiam com força, salpicando até ao topo e fazendo jus ao nome da pedra. Provavelmente por isso os poucos turistas quedavam-se mais para trás, receando os tremores.

Na última conversa tinham chegado ao séc. XX com o grande sucesso do tratamento dos dados do censo nos Estados Unidos, graças ao uso dos cartões perfurados de Hollerith.

— Pelo que o professor disse outro dia, eu ainda nasci no séc. XX, em 2000.

— Pois sim, mas não te apercebeste dos importantes desenvolvimentos que nele se verificaram: na Agricultura com os fertilizantes; na Indústria Automóvel com as linhas de montagem e a produção em massa; na Aviação com a construção dos aviões gigantescos e do motor a jacto; na Saúde com os antibióticos e a pílula contraceptiva; para o Lar os electrodomésticos; e na Computação com o progressivo aperfeiçoamento dos processadores, e a miniaturização com os circuitos integrados.

— Já me sinto a afogar em tanto progresso! — Exclamou Bit.

— E nem falei da conquista do espaço: o lançamento de satélites e a ida do homem à Lua. — Byte achava que já era suficiente e passou ao tema dos computadores. — Na primeira metade do século dois nomes são dignos de realce: Konrad Zuse (1910-1995) e Howard Aiken (1900-1973).

— O livro que o professor me emprestou referia os computadores da série Zn que o engenheiro alemão Zuse produzira. — Bit demonstrava o seu interesse pela matéria. — O Z1 foi o primeiro computador programável e o mais recente, o Z4, foi utilizado para fins comerciais, não foi?

— Sim. Ele inventou o primeiro computador electromecânico, constituído por relés.

— E o Aiken? — Interrogou Bit. — Foi igualmente famoso?

— Sim, sim. Aiken, americano, desenvolveu a série dos computadores Harvard Mark I a Harvard Mark IV, já sob o patrocínio da IBM.

— Só para fazeres uma ideia do tamanho desta máquina, o Harvard Mark I usava 765.000 componentes electromecânicos e 900 km de fios condutores, media 16 m de comprimento, 2,4 m de altura e 0,61 m de profundidade.

— Tão grande! — Bit não escondia a sua admiração. — E quanto pesava essa bisarma?

— Era pesadinho, lá isso era! 4.500 Kg. O que achas? — Byte estava eufórico com a admiração que provocava em Bit. — E isto nos anos 40 do século passado.

Byte ainda pediu a Bit que procurasse no livro que lhe emprestara a imagem deste gigantesco Mark I.



— Vai levar algum tempo, alguns anos, até os computadores reduzirem o seu tamanho e aumentarem a sua capacidade de processamento. Esta evolução vai depender dos desenvolvimentos da electrónica e da substituição dos relés pelas válvulas.

— Válvulas!? — Exclamou Bit. — Mas isso não é coisa dos motores de automóvel?

— Não só! — Byte contemporizou. — São outras. Hás-de conhecer as diferenças… Bem, vamos andando. Hoje estou convidado para jantar na “Curva”, queres vir?

— Hum! — Bit engoliu em seco. — Já que convida, nem precisa insistir!

X. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme - HOLLERITH e o Censo dos EEUU de 1890

 Naquela tarde a Pedra Treme-Treme estava ocupada. Dois casais fingiam pescar, um em cada extremo, e Byte decidiu que se afastariam para sul, para o Barbião ou para o Penduradoiro, deixando os moços à vontade.

Para a lição de hoje Byte preparara uma abordagem à importância do Cartão Perfurado para o progresso da Informática na viragem para o Séc. XX.

— Ainda te lembras do tal engenheiro que pôs os teares a funcionarem com cartões perfurados?

— Sim, o francês Jacquard. Foi uma engenhoca de grande sucesso.


— Engenhoca!? — Byte exasperou-se. — Uma invenção. Uma invenção é que foi. Pois cerca de cem anos passados, provavelmente baseando-se naquela invenção, o americano Herman Hollerith, concebeu uma nova aplicação para cartões perfurados.

— Mais teares… — Murmurou Bit.

— Não, nada disso. — Byte encarou Bit com cara séria. — Usou os cartões perfurados para a introdução de dados para serem processados pelos computadores da altura.

— Mas como?! — Questionou Bit.


— Ele trabalhava no United States Census Bureau e inventou uma máquina para fazer o processamento das operações de recenseamento da população dos Estados Unidos. Os dados eram fornecidos a essa máquina através de cartões perfurados segundo um código concebido para o efeito e que se chamava BCD (Binary Coded Decimal) ou seja, Decimal Codificado em Binário.

— E o princípio é o mesmo do Jacquard? — Bit parecia compreender. — Já estou a ver, onde havia um buraquinho no cartão era restabelecido um certo circuito eléctrico.

— Grosso modo. — Byte contemporizou. — O objectivo era fazer contagens, pois tratava-se de um censo. Cada circuito estava ligado a um contador específico e quando era restabelecido pelo contacto das extremidades na perfuração, o contador era incrementado.

— E no fim podia-se ler quantos dos recenseados eram homens e quantos eram mulheres. — Bit estava orgulhoso por ter percebido a importância da aplicação dos cartões. — Isso deve ter sido uma grande ajuda para a contagem.

— E foi mesmo. Repara que dez anos antes, em 1880, o apuramento de resultados tinha demorado sete anos.

— Sete anos? — surpreendeu-se Bit. — Mas eram assim tantos os americanos?

— Sim, eram muitos milhões e a contagem muito lenta. — Respondeu-lhe Byte. — E para o de 1890 eram esperados 10 anos para a obtenção dos resultados. Mas com a solução de Hollerith, os dados dos 62.622.250 de recenseados foram tratados em apenas seis semanas.

— Isso foi um grande sucesso!

— É claro! Hollerith percebeu que no censo poderia usar perguntas para serem respondidas apenas com SIM ou NÂO, a que corresponderia uma perfuração ou uma não-perfuração. — Byte fez uma pequena pausa e observou: — Cá está a tal Álgebra Binária, lembras-te.

— Isto está tudo relacionado… — Bit ia percebendo a complexidade do processamento.

— Hollerith teve um estrondoso sucesso e a sua solução foi adquirida por vários países. Ele foi considerado o pai da Informática por ter sido o primeiro homem a conceber e usar o tratamento automático de dados. Foi ainda um dos fundadores da sobejamente conhecida IBM.

— Olhe professor, os namoradinhos já deixaram a ponta da rocha. Voltamos para lá?

— Não, vamos embora. Hoje entrámos no séc. XX, amanhã continuaremos.

IX. (INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme) - BOOLE e a Álgebra Binária

Petiscaram mais um pratinho de burgaus e, desta vez, Byte optou por imperiais. Sentia-se bem e a imperial amarga ir-lhe-ia dar mais prazer do que a pirolitosa cheia de açúcar. Viu-se um brilhozinho nos olhos de Bit quanto propôs as cervejas.

Ficaram calados por uns momentos enquanto Byte estendia o olhar pelo rio acima, percebendo o efeito da maré a subir, provocando pequenas ondas que iam deixando marcas alternadas na margem do rio, no lado do areal. Mais areia molhada e menos areia molhada.

A sua mente, habituada às questões informáticas e ao código binário, de imediato atribuiu às ondas maiores o dígito 1 e às ondas menores o dígito 0. Curioso! Não fosse ele tão racional e poderia achar que o mar estava a comunicar com ele, através de zeros e uns.


Entretanto Bit já tinha acabado a primeira imperial e pedido outra que bebericava devagar, com olhos de sono.

— Bit! Olha Bit, sabes que os nossos nomes, Bit e Byte, de algum modo têm uma relação com as ondas do mar?

Bit reagiu e regressou do seu afastamento.

— Mas eu sei que o nosso padrinho foi um matemático inglês de nome Biule; com mau gosto para nomes, diga-se.

— Qual Biule nem meio Biule! Chamava-se Boole, George Boole, e foi de facto um famoso matemático inglês, que se tornou padre. São-lhe atribuídos estudos sobre a Lógica e um tipo de álgebra que, em sua homenagem, é conhecida por Álgebra Booleana.

— Mas onde é que ele se inspirou para nos chamar Byte e Bit?

Byte pigarreou, e avançou. — Estes nossos nomes só mais tarde é que “apareceram”. A álgebra booleana surgiu por volta de 1860; era a Lógica Binária, que constitui, ainda hoje, a base do cálculo computacional, um poder inigualável. Inclui operações como “Negação”, “E”, “Ou”, “Ou Exclusivo”.

— Não percebo bem, mas… — Bit exclamou. — O senhor fala dessa álgebra como sendo uma coisa tão surpreendentemente fácil, e os computadores, tanto quanto sei, são sistemas altamente complicados!

— E tens razão. — Byte pensou numa forma simples de lhe explicar o funcionamento do processador, mas achou que Bit ainda não tinha as bases suficientes para um melhor entendimento, pelo que abreviou: — Mas todos os processamentos, mesmo os mais complicados, são reduzidos internamente a operações binárias, dentro daquela Lógica. Simples, não achas?

— Hei-de perceber melhor quando chegarmos às linguagens de programação. Sim, que o que eu quero é ser Programador! Fazer programas para resolver os meus problemas, tipo, como fazer o meu subsídio chegar até ao fim do mês, e assim.

— Se me continuares a ouvir com interesse e atenção, certamente lá chegarás. Nessa altura irás perceber que uma onda maior pode valer 1, e que uma onda pequena pode valer 0. Nesse dia vamos a Lagos comprar-te um computador portátil para te ensinar e praticares.

— Ena! E com Internet e Wi-Fi? — Bit entusiasmado.

— Sim. Isso tudo. Mas vai levar algum tempo… Vamos até à Vila, que o sol já se está a esconder, podes ir pôr a motora a trabalhar. — E dirigindo-se ao empregado de mesa: — Jovem, esta conta é comigo.

VIII. INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme - COMPUTADORES PROGRAMÁVEIS

 

Desta vez Byte tinha aceitado irem na velha Famel que Bit tinha recuperado. Em vez de ir directamente para a Ponta da Rocha, Bit guinou para a direita, em direcção ao pequeno largo onde a estrada terminava.

— Prof Byte vamos beber uma gasosa fresquinha ali na Taberna. ‘Bora lá pago eu!

— Não digo que não, tenho a garganta seca e com um sabor a gasolina. — E pondo um ar mais sério que o habitual, — Já sabes que detesto que me chames prof, isso não é nada.

Entraram na Taberna, vazia naquele fim de tarde, e sentaram-se a uma mesa com uma vista fabulosa sobre a Praia da Amoreira. Com simpatia o empregado serviu-lhes as gasosas e, por gentileza do patrão, deixou-lhes um pires com burgaus.


— Está-se aqui lindamente, um bom sítio para a nossa converseta, — murmurou Byte, quase imperceptível.

— Então acaba lá com os burgauzitos e prepara-te para ouvir. Hoje vais conhecer uma das mais importantes figuras do século XIX, Charles Babbage.

— Prof, desculpe, professor, esse nome não é totalmente novo para mim. Já li qualquer coisa sobre ele, ou sobre a mulher dele, a Anna Love qualquer coisa.

— Estás a confundir nomes e pessoas. — Byte pigarreou — Babbage foi um cientista, matemático, filósofo, engenheiro mecânico e inventor londrino e é-lhe atribuído o conceito de um computador programável.

— Ora aí está uma profissão que eu gostaria de ter: programador de computador…

— E achas que te tornarás programador por inscrição?! Tens de queimar muitas pestanas…

— Pois Babbage projectou, apenas projectou o primeiro computador de uso geral, utilizando apenas partes mecânicas, a que deu o nome de Máquina Diferencial e, mais tarde, outro projecto chamado Máquina Analítica.

— Ele estava muito à frente para o seu tempo, — continuou Byte, — o seu invento exigia técnicas bastante avançadas e caras na época, e… nunca foi construído.


— Então e a Ana Love? — Inquiriu Bit.

— Já percebi que não vais além de uma vaga ideia, — respondeu Byte, — vaga ideia, mesmo muito vaga. Trata-se de Lady Adda Lovelace, sua amiga, filha de Lord Byron, é considerada a primeira programadora de computadores, tendo escrito o primeiro algoritmo para ser executado por uma máquina.

— Para te localizares na linha do tempo anota que Babbage viveu entre 1791 e 1871 e Lady Ada entre 1815 e 1852.

— Terminámos. Agora sou eu a convidar. Vai mais uma gasosa e uns burgauzitos?

INFORDIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme

 VII.     Um tear mecânico programável

 

— Entretanto passaram-se quase três séculos sem que se registassem grandes novidades. Hoje vamos falar do século XIX. — Escuta cá, ó Bit, sabes quando é que começou o século XIX?

Bit observava duas traineiras que vogavam frente à rocha, num suave ondular desapareciam totalmente e voltavam a aparecer, como se navegassem em ondas gigantes. Mas não, era apenas um suave ondular… Com a ajuda de um pequeno óculo percebia perfeitamente o nome de um dos barcos: “Boa Viagem II”.

— É o pessoal do César! — Exclamou eufórico. — É o César!

— Bom, estás cá, ou andas no mar? — Remocou Byte. — Perguntei-te se sabias quando é que começou o século XIX.

— O século XIX? Ora quando foi?! — Demorou a resposta fingindo fazer contas de cabeça. — Foi em 1800, Janeiro de 1800!

— Estás enganado. Aliás, como um grande número de pessoas. Foi em 1801. — E explicou para os séculos seguintes. — O Século XX, em 1901, e o actual, em 2001!

— Por essa ordem de ideias, Cristo nasceu no ano 1, não?! — Contrapôs Bit.

— É claro que nasceu no ano 1. — Byte foi peremptório. — Não recuso aprender algumas coisas contigo, mas quanto a este tema, não há discussão. — E continuou a introdução ao século XIX. — Saliento algumas notas deste século: a população europeia atinge cerca de 400 milhões, sendo Londres a mais populosa cidade do mundo com 6,7 milhões de habitantes; foi abolida a escravatura; os franceses vieram por Portugal a dentro; Darwin publica a “Origem das Espécies” e a Igreja zanga-se.

— Já tinha ouvido sobre isso. Mas… — Bit queria voltar à evolução dos computadores.

— O personagem mais importante na entrada do século foi Jacquard. — Byte, pacientemente, continuou. — Filho de tecelão e conhecendo o equipamento paticamente desde criança, construiu em 1804 um tear automático que tinha a capacidade de ler e executar sequências de operações “escritas/perfuradas”, segundo um determinado código, em cartões metálicos, ligados por anéis também metálicos.

 



— Desculpe lá, professor, não percebo bem como é que isso funcionaria. — Bit, com matreirice. — Temos lá na vila, numa arrecadação, um velho tear; diz o meu pai que tem mais de cem anos, e não estou a ver como funcionaria com esses cartões.

— Achas? — Byte, irónico. — Como esse teu tear é manual, fazes a leitura a olho, defines a trama e passas a lançadeira de acordo com instruções mentais! — E continuou. — Fica sabendo que o uso dos cartões perfurados de Jacquard revolucionaram a indústria têxtil e tiveram, alguns anos de pois, uma importante influência no processamento de dados.

— Bem, de teares percebo mesmo muito pouco. — Admitiu Bit. — Mas de cartões perfurados já ouvi falar. A minha tia Matilde, já velhota, foi perfuradora de cartões quando trabalhou em Lisboa. Mas ela dizia que eram para os computadores, e nunca me falou em teares.

— Pois não eram os mesmos. — Esclareceu Byte. — Mas esses mais modernos basearam-se nessa ideia do princípio do século XIX.

— Olhe professor, o César já está de regresso. Vamos também?

— Vamos lá, vamos lá. — Balbuciou Byte, com um encolher de ombros. — Os dias cada vez rendem menos…

INFOR-DIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme

 VI.       Mais ferramentas de Cálculo

— Professor Byte, esta noite, para chamar o sono entretive-me a folhear aquele seu livro sobre os computadores. — Bit fazia assim uma tentativa para chamar a atenção de Byte que parecia ter entrado em meditação, calado que estava há mais de um quarto de hora. — Fiquei curioso com a imagem dum anúncio da IBM sobre uma das suas primeiras máquinas.

Byte, sem desviar o olhar da ponta norte da praia da Amoreira, murmurou: — Esta praia é duma beleza extraordinária! Já reparaste? — Um riozinho a desaguar aqui em baixo, proporcionando uma maravilhosa piscina marítima, um imenso areal dourado e, lá adiante, aquela rocha recortada em bico. Esta costa… aqui houve mão de quem não é deste mundo.

— É verdade, não me canso de admirar a natureza. — Concordou Bit. — Mas o anúncio da IBM, lembra-se?

— Deves referir-te à IBM 604 Electronic Calculating Punch, não é? Uma mudança radical no cálculo.

— Essa mesmo. — confirmou Bit. — A IBM anuncia que “tem a capacidade de produzir o trabalho de 150 engenheiros com Réguas de Cálculo”!

— Sim, foi uma revolução!

— Mas a Régua de Cálculo ainda era tão usada nos anos 50? — Espantava-se Bit. — É uma ferramenta tão antiga…

— Tens razão. — Concordou Byte. — Apesar de ter sido inventada aí por 1620 pelo matemático inglês William Oughtred (1570-1660). Concebeu-a inicialmente na forma circular e, posteriormente, na forma longitudinal.

 

— E o desempenho da tal máquina da IBM é medida em… Réguas de Calculo?! — Bit estava cada vez mais surpreendido. — Então ao longo de cerca de trezentos anos, não se registou qualquer evolução na área dos auxiliares de cálculo?!

— Quanto à evolução dos computadores, há vários desenvolvimentos, várias etapas que assinalarei mais à frente. — Byte, pigarreando a garganta. — Mas a Régua de Cálculo manteve-se em uso durante muitos anos. Eu próprio ainda a usei na universidade. Era portátil e… barata.

— Então não havia máquinas de calcular?

— Não na forma que actualmente as conhecemos. As primeiras electrónicas da Casio, fabricadas em série, apareceram nos anos 60. — Explicou Byte. — Só nos anos 70 é que a HP marcou posição no mercado com as chamadas “científicas de bolso”. Caríssimas…

— Mas a Régua de Cálculo superou a Pascalina! — Bit aproveitou para falar revelar os seus conhecimentos. — A máquina que Pascal concebeu para ajudar a contabilidade do seu pai.

— A Pascalina teve o seu sucesso. Foi a primeira construída em quantidade: 50 exemplares. — Byte pegou no tema e preparou-se para o estender. — Era muito engenhosa para 1642. Mecânica, claro! A electricidade só mais tarde é que foi descoberta. Somava e subtraía e, por repetição, multiplicava e dividia.

— O seu contemporâneo von Leibniz (1646-1716), considerado estar dois séculos à frente do seu tempo, aperfeiçoou a Pascalina com a sua Calculating Machine, que efectuava as quatro operações. Foi injustiçado pela sociedade. — Byte tinha um especial apreço por este cientista, tão prestigiado que fora, mas que morreu solitário e esquecido.

— Prefiro a Régua, essa não tem nenhuma engrenagem, apenas peças móveis. — Insistia Bit.

Voltando ao início da conversa, Bit concordou com a beleza da Amoreira. O rio e a boca da barra proporcionavam a aventura de combater ou aproveitar a corrente das marés.

— Já vim desde os Salgados até aqui com a ajuda dum bocado de cortiça. Só precisei de dar umas braçadas para sair da corrente antes de entrar no mar. — Orgulhoso, encheu o peito de ar. — Prof, sou um bom nadador, sabe? Aprendi nos pegos da ribeira e… na Poça d'Arrã.

INFOR-DIÁLOGOS na Rocha Treme-Treme

 V.        Os Ossos de Napier


— Afinal não trouxeste minhocas da areia… Como vais iscar? — Provocava Byte.

— Simples. — Respondeu Bit. — Apanhei uns mexilhões; os sargos não resistem!

Perante o olhar curioso de Byte, Bit retirou o miolo de um mexilhão, enfiou no anzol, e procurou no seu bornal um bocado de meia de senhora donde puxou um fio que enrolou no anzol, para prender o isco.

— Nunca falha. Garantiu-me o César, da Arrifana. — E fez o lançamento com a sua cana-da-índia. — Este Byte tem mas é a mania! Sabe da História dos Computadores, mas de pesca à linha não é grande coisa. — Disse em voz tão sumida que só ele poderia entender.

— Cá estou para ver. Enfim, ensinar é também trocar saberes. — Byte preparou-se para mais uma palestra. Se fosse no jardim, até lhe chamaria de peripatético, mas ali, na rocha alcantilada, continuaria as referências ao séc. XVII sentado, sem tropeções.

— Já ouviste falar de John Napier? — Byte pretendia dar um ar mais sério a esta charla. — É claro que não, ele andou pela Escócia, Edimburgo, onde existe uma universidade com o seu nome, na passagem do século XVI para o Século XVII! E dos logaritmos neperianos, já?

— Dr. Byte, lembro-me bem das minhas aulas de matemática! — Retorquiu Bit, um pouco irritado. Por tudo e por nada Byte lhe chamava, indirectamente, ignorante. — Usávamos quase sempre a Tabela pois uma máquina de calcular com essa função, nem todos tínhamos.

— Percebo, os cálculos são sempre complicados.— Acrescentou Byte. — Pois Napier inventou um sistema para efectuar cálculos, divisões ou grandes multiplicações, e até raízes quadradas, constituído por várias “tabuinhas” que rapidamente foram divulgadas e eram conhecidas como os “Ossos de Napier”.

— Grandes contas… com tabuinhas! — Admirou-se Bit. — ‘Tou p’ra ver!

Byte vasculhou a sua sacola donde tirou uma caixinha de madeira e montou as barras necessárias para uma multiplicação de 8 algarismos por um:


Devidamente posicionadas, como na imagem, na linha 1 o multiplicando, e na coluna 1, a dos multiplicadores, procura-se a linha correspondente ao 7; na continuação dessa linha faz-se a soma dos dois algarismos em cada diagonal (da direita para a esquerda) e obtém-se assim, rapidamente, o produto, não esquecendo que quando a soma dos dois algarismos for igual ou superior a 10, temos de considerar o transporte (e vai 1).

— Ena pá! Estou siderado! Tão simples… e tão eficaz!— Suspirou Bit. — É quase como o “ovo de Colombo”!

— Ficaste tão concentrado nos “Ossos” que até te esqueceste da pesca. Olha a tua cana como verga. Não montaste o chocalhinho?

Mais uma vez Bit se irritou. Byte percebia de tudo, e de qualquer coisa fazia uma aula. Mas de pesca, quem percebia era Bit. Começou a enrolar o carreto, sentindo o peixe rabiar na ponta da sedela.

— Belo peixe! — Exclamava Bit com satisfação. — Devagar, devagarinho. Não te soltes que vais parar à grelha para o jantar.

Lentamente, muito lentamente, puxou a dourada para cima da rocha.

— Mais de um quilo, Byte. Vai dar para os dois! — E retribuindo a ironia de Byte — Vamos precisar dos Ossos de Napier para dividi-la!

CarlNasc

Webgrafia: en.wikipedia.org; www.history-computer.com;www.computinghistory.org.uk;computerstory.weebly.com/